24 de jun. de 2011

ARMÁRIOS DO TEMPO.

Na existência do passar dos tempos sentimentos agigantados findaram. Juras de amor se perderam. Despedidas se fizeram. O tempo de atrás tem historias não esquecidas que se contam na lembrança do que já foi. O armário do tempo tem gavetas inúmeras que guardam memorias merecidas de respeito e ternura. Tem conteúdos armazenados nas prateleiras da vida. Tem um baú de esconderijos que resguarda episódios decorridos. Tem fechaduras de segredos que guardam lembranças originais. Tem poeiras que acobertam um amontoado de coisas que revelam mais do que se mostra ser. O mesmo tempo disfarça os conteúdos. Vasculha. Mistura. Separa. Assombra. Rotula. Agita. Acomoda. Aproxima. Distancia. Restringe. Amplia. Intimida. Preocupa. Ocupa. Interage. Integra. Contrapõe-se. Contradiz-se. Completa-se. Por fim, não responde a lógica alguma. Não abre brechas a explicações. Esses disparates do tempo anulam as resistências internas. Sabotam as defesas. Confrontam nossas certezas com a relatividade de nossa própria existência. Embotam o pensamento enquanto não nos fazermos concordantes de suas condições. A razão responde menos ao que se percebe mais ao que se sente. Passamos, a saber, aquém do que supúnhamos saber. Nosso armário retém histórias que perpetuam um contínuo muito além de nós mesmos. De um tempo que em determinado momento, deixou de nos pertencer.

INVERNO. (2011)

Não se trata só de uma estação que começa. Novas sensações. Novos odores. Novas cores. Outros ritmos. Novos cenários desenham-se no transcorrer dos dias, agora mais curtos. Paladares mais aquecidos. O deleite de uma sopa. De um chá. De um café cheiroso coando devagar sobre o fogão. De uma taça de conhaque brincando entre os dedos. De um gole de cachaça para afoguetar o rosto. Um cobertor para ninar. Uma pantufa para os pés esquentar. Um cachecol para o pescoço aquecer. Um banho com uma enxurrada de água quentinha. “Duchas corona, um banho de alegria num mundo de água quente” (rs. Invernos da infância em frente a TV). Folhas nas calçadas. Vidros umedecidos. Janelas embaçadas. Chuvas gélidas. Ruas vazias aos sopros do vento. A névoa cresce pela madrugada. E permanece acompanhando os primeiros e tímidos raios de sol manhã adentro. O sol chega mais tarde e vai embora mais cedo. A cidade esquenta no movimento vai- e- vem dos transeuntes cotidianos. Um tom acinzentado toma conta das telas urbanas. Um ar solitário encerra as paisagens rurais. Estação que faz surgir maior intimidade de um aconchego. Um sentir mais reservado. Um sentimento romanceado. Talvez brega. Um pouco acanhado. Um tanto privado. Protegido. Que o inverno se deixe começar novamente. E de repente nos envolva no resguardo de temperaturas frias que então nos empurram para achegos aquecidos.

MINHA ESCRITA.

Minha escrita me delata numa mistura de letras, frases, parágrafos inteiros. Aqui, todos os meus silêncios. Os meus cantos. Os meus sentidos. Todas as minhas emoções. Os meus sentimentos. Todas minhas verdades absolutas relativizadas. Minhas mentiras ocultas. Não explícitas. Minha fisiologia retratada na forma que se desenha o texto de então. De outrora. Por ainda completar-se. Faço-me num fluxo de misturas semânticas que se largam ao sabor de combinações tantas. Vagando aos significados de outras percepções. Não que percam seus significados reais aos meus mais íntimos. Pelo contrário. Na condição despojada de meus mais particulares ditos, acrescenta-se o de outras grandezas. Tornando mais excelentes meus traduzidos. Enriqueço na diversidade das interpretações. Sem a pretensa ousadia de uma sintaxe perfeita, me resguardo por traz de vocábulos infinitamente seculares. Não escrevo por determinações. Por decretos. Por trabalho. Escrevo-me por sentidos. Primeiro o de uma contínua necessidade de escutar a mim mesma. Segundo, o de num constante agradecer aos que me escutam comigo mesma. Compartilhando de minhas reflexões. De minhas sensações. De minhas repetições. Como é difícil não me repetir. Identifico, mas, de certa forma, ainda não sei o parar desse meu agora cotidiano. É uma escrita que ressurgiu para passar ao cotidiano. Meio rustica. Meio envergonhada. Meio atropelada das letras e dos pontos; dos inicios e dos fins. Meio repetitiva. Meio delirante. Meio verdade. Meio fantasia. Meio sentimento. Meio reflexiva. E como já ouvi, meio confessional. Aqui estou me dizendo. Colhendo diferentes de mim. Diferentes maturidades. Diferentes combinações. Diferentes vivências. Para que novamente me faça em escritas quaisquer. Minha escrita é sentimental. Um templo de gentes, sensações, emoções e sentimentos, lembranças, de agoras, de amanhas. Uma escrita que se faz ainda quando o acontecido não se completa. Uma escrita de pedaços. De frações. Às vezes, de inteiros. De um dia. De uma semana. De um mês. De uns anos. Quiçá, por toda uma vida...de uma vida toda.